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SÃO PAULO – Instalar parques de energia solar e de energia eólica no deserto do Saara, na África, pode ter duplo efeito positivo para o planeta. O primeiro motivo é o mais óbvio: as energia do Sol e dos ventos são as mais limpas entre todas as matrizes utilizadas pelo homem até hoje. A outra razão é uma novidade para a ciência: estudo publicado na revista Science demonstra que a aplicação das duas tecnologias combinadas pode aumentar o volume de chuvas na região em cerca de 150%.

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A pesquisa, liderada pela cientista atmosférica Eugenia Kalnay, da Universidade de Maryland, produziu uma simulação em computador na qual 20% da superfície do deserto seria coberta por painéis solares, além de prever a instalação de centenas de parques eólicos. Do ponto de vista energético, o resultado foi poderoso: estima-se que a produção de energia elétrica chegue a 82 terawatts, cerca de quatro vezes o consumo global atual.

O objetivo do estudo, contudo, era outro: demonstrar que a aplicação destas tecnologias pode transformar o regime pluvial do Saara. A maior parte dos mais de 9 milhões de metros quadrados do deserto é coberto de areia, embora haja pequenos bolsões de vegetação nativa. Essas pequenas áreas arborizadas agem como um manto que absorve a luz do sol, aquece o solo, reflete o calor e, assim, impulsiona o ar quente para cima; este ar eleva a umidade da atmosfera como vapor e encontra o ar gelado acima, onde a água de condensa e volta à terra como chuva.

Mas, como hoje as largas áreas áridas são mais vastas do que os núcleos de vegetação, a maior parte do deserto não recebe água das chuvas e se expande no processo chamado de desertificação. Por isso, somente no último século, o Saara cresceu 10% de seu tamanho. E conforme ele cresce, gera mais esterilidade e, consequentemente, compromete ainda mais o ecossistema local e seus arredores.

“Ocorreu-me que o mesmo [ciclo poderia] ir no sentido oposto, o que aumentaria a precipitação [da chuva], a vegetação e, em seguida, mais precipitação”, explicou Kalnay em entrevista à emissora norte-americana National Public Radio (NPR).

Painéis solares no deserto de Atacama, Chile

Painéis solares no deserto de Atacama, Chile

Como os painéis solares e campos eólicos geram chuvas no deserto?

A lógica proposta é de reverter os efeitos da desertificação, na qual os painéis solares cumprem o mesmo efeito que os bolsões de vegetação. O equipamento absorve a energia do Sol, tal qual as plantas fariam, retendo calor e deixando a superfície muito quente – é o contrário do que ocorre no solo arenoso, que reflete os raios solares e, consequentemente, o calor. Este movimento empurra a massa de ar aquecida para cima, facilitando a formação de chuvas.

A estratégia inclui também a implementação de um arsenal de parques eólicos: suas hélices e turbinas geram energia, mas também podem manipular a corrente de ventos de uma determinada região. Se, juntas, elas reduzirem a velocidade do vento e unirem massas de ar quente e frio juntas, formam-se mais nuvens de chuva.

Segundo o artigo, a ação seria temporária, como um impulso para a natureza regularizar seu regime de chuvas e permitir a regeneração massiva da vegetação, gerando um efeito de ciclo virtuoso: mais chuvas, logo, mais vegetação e, portanto, mais chuvas.

Outra consequência seria o aumento da temperatura média em aproximadamente 2,8°C,  mas com umidade.