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SÃO PAULO – O ministro das Cidades Bruno Araújo, líderes setoriais e os presidentes de algumas das maiores companhias de saneamento do Brasil se reuniram ontem (4), no Congresso Abes Fenasan 2017, em São Paulo, para discutir os desafios no caminho para a universalização do serviço de água e esgoto no País. O painel, mediado por Márcio Gonçalves de Oliveira, presidente da Abes-SP (Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental), teve a participação de Teresa Vernaglia, presidente da BRK Ambiental, Aparecido Hojaij, presidente da Assemae (Associação Municipal dos Serviços Municipais de Saneamento), Jerson Kelman, presidente da Sabesp (Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo), Mounir Chaowiche, presidente da Sanepar (Companhia de Saneamento do Paraná) e Jalles Fontoura Siqueira, presidente da Saneago (Saneamento de Goiás).

Arrumando a casa

O ministro das Cidades, o deputado federal licenciado Bruno Araújo (PSDB-PE), foi um dos primeiros a falar e deu um panorama do que encontrou quando assumiu a pasta, em 12 de maio de 2016. Segundo Araújo, ao fazer um levantamento dos investimentos prometidos pela pasta aos Estados e municípios brasileiros, sua equipe percebeu que os valores empenhados equivaliam à soma de 41 anos de orçamento de toda a pasta – que também cuida de outras áreas, como mobilidade. “Me assustou”, disse Araújo. “Era uma folha de papel com contratos impossíveis de ser executados”. Rever todos esses contratos, junto de prefeitos e governadores, foi uma de suas primeiras funções.

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“Hoje operamos com um déficit de investimentos anual em saneamento de R$ 8 bilhões a R$ 10 bilhões”, disse Araújo, sobre os investimentos anuais requeridos para garantir a universalização até 2035. Segundo o ministro, a revisão do Plansab (Plano Nacional de Saneamento Básico) é uma das medidas mais importantes para garantir um fluxo de investimentos sustentável nesse sentido. Integrar as iniciativas em saneamento em um único ministério – hoje, elas se espalham por pastas como Saúde, Integração Nacional e Cidades, entre outras – também foi indicado como caminho positivo. “O setor de saneamento é um dos que mais denigre o Brasil”, afirmou. Mudar esse cenário foi colocado como prioridade.

Universalização e investimento privado

O painel prosseguiu com uma pergunta básica, respondida por todos os presentes, e colocada pelo mediador, Márcio Oliveira, presidente da Abes-SP: como reduzir os históricos déficits de atendimento e avançar no rumo da universalização com o desafio de investir mais e melhor?

Teresa Vernaglia, presidente da BRK Ambiental, lembrou que o déficit de investimento anual superior a R$ 10 bilhões pode ser visto como uma grande oportunidade para aportes tanto públicos quanto privados. “O atraso é muito grande, então tem espaço pra todo mundo”, afirmou. Vernaglia lembrou, ainda, que ter “clareza do arcabouço regulatório”, nesse cenário, é fundamental. A segurança jurídica dará confiança para os investidores privados dispostos a empenhar os bilhões que o setor precisa para atender mais e melhor.

Jerson Kelman, presidente da Sabesp, acompanhou Teresa em seu argumento sobre a importância de se ter clareza do arcabouço regulatório e criticou o fato de que, hoje, boa parte das regras são estabelecidas pelos municípios. “Temos que pensar a regulação em nível Estadual”, afirmou. Assim, em vez de mais de 5,5 mil diferentes conjuntos de regras para o saneamento – são mais de 5,5 mil municípios no País – haveria 26 conjuntos, o número de Estados que compõem a Federação.

No sentido de aumentar os recursos para o setor, Kelman lembrou, também, do projeto de lei do senador José Serra (PSDB-SP), coadjuvado pelo deputado federal João Paulo Papa (PSDB-SP), que prevê a isenção de PIS/Cofins para empresas de saneamento. “O recurso fica melhor empregado sem ir pro tesouro e voltar [em forma de investimento]”, disse Kelman. Com a aprovação do projeto de lei, estima-se que o setor deixaria de pagar cerca de R$ 4 bilhões em impostos, que, segundo Kelman, poderiam ser investidos na expansão e melhoria dos serviços de água e esgoto.

Tarifa real e gestão eficiente

Em sua exposição, Mounir Chaowiche, presidente da Sanepar, aproveitou para falar da importância, neste esforço, de se cobrar uma tarifa real, para que o consumidor entenda melhor o custo da água. Ele lembrou, ainda, que, sem gestão profissional, nenhuma empresa – muito menos uma empresa de saneamento – dá certo. Seu raciocínio foi acompanhado por Jalles Fontoura Siqueira, presidente da Saneago. Chaowiche também mencionou de forma passageira dois assuntos que foram tema em algumas mesas do Congresso Abes Fenasan 2017, mas que costumam ser pouco discutidos quando se fala de saneamento: a gestão dos resíduos sólidos e a drenagem urbana.

“Saneamento não é moeda de troca”

Aparecido Hojaij, presidente da Assemae, foi cauteloso nas suas colocações. No âmbito da discussão do Plansab, ele pediu cuidado para que o debate pela revisão não se torne um descarte de todo trabalho que já foi feito. “Rever tudo seria nefasto”, disse Hojaij. “A regulação precisa ser melhorada, mas também deve ser vista como um importante instrumento de gestão”, afirmou.

Sobre a discussão em torno da privatização das operações públicas de saneamento pelo País, ele não se colocou contra, mas alertou para cuidados importantes a serem tomados nesses processos. “Transformar o saneamento em moeda de troca e abrir um balcão de negócios para fazer caixa e cobrir erros de gestão não é um bom caminho”, disse.

Hojaij alertou ainda que eventuais mudanças na legislação que regula o saneamento no País precisam ser amplamente debatidas antes de passarem a valer. Nesse sentido, ele se mostrou contrário à possibilidade – confirmada pelo ministro Araújo – de que parte dessas alterações ocorram por meio de Medida Provisório (MP), e não com projeto de lei, que requer tramitação pelo Congresso Nacional.