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SÃO PAULO – Não é de hoje que as ideias de preservação e de uso consciente acompanham qualquer discussão séria sobre a água. E esse discurso ganhou importância e amadureceu durante a grave crise de abastecimento que assolou o Brasil – e a região sudeste, em especial – entre os anos de 2014 e 2015. Nos meses de baixa recorde dos mananciais que atendem as maiores metrópoles do País, a agenda sustentável finalmente ganhou espaço proporcional a sua importância e os programas de valorização da água e de incentivo ao consumo consciente viraram prioridades. Muitos mudaram hábitos, houve economia real e falou-se de água como nunca. Enfim choveu e os índices que medem o volume de água nos principais mananciais subiram de forma expressiva.

Em nível nacional, porém, um índice pouco mudou durante a crise e em muito incomoda quem trabalha com recursos hídricos no País: o das perdas de água na distribuição. Embora hoje os esforços para diminuir esse índice sejam mais intensos e eficientes do que nunca (leia abaixo), ele permanece em vultosos 36,7%, de acordo com os dados mais recentes do Sistema Nacional de Informações Sobre Saneamento (SNIS), órgão vinculado ao Ministério das Cidades. Em 2013, quando as perdas estavam em 37%, o Instituto Trata Brasil estimou o volume de água tratada perdida no País em 6,5 bilhões de metros cúbicos ao ano, o que dá 6,5 vezes toda a capacidade de armazenagem do sistema Cantareira, no Estado de São Paulo.

É água suficiente para abastecer 50 milhões de pessoas por um ano. Vendido, esse volume renderia pouco mais de R$ 8 bilhões às prestadores de serviços de saneamento básico, que poderiam reinvestir parte importante desse valor na expansão dos serviços para incluir quem ainda não está na rede e em campanhas em prol do consumo consciente e da redução de perdas.

Perda física e perda aparente

A imagem clássica do fluxo contínuo de água limpa escorrendo ininterruptamente de um vazamento representa, apenas em parte, a realidade das perdas deste precioso recurso. Chamada de perda física ou perda real, essa forma mais reconhecível de desperdício corresponde a cerca de 60% de toda perda de água no País. E ela tem como causas mais frequentes a idade da tubulação, o assentamento indevido desta tubulação – que estressa o material -, variações de pressão na rede e movimentação do solo.

Os outros 40% são das chamadas perdas aparentes e dizem respeito à água tratada e distribuída, mas que não gera nenhum tipo de receita. De maneira geral, nessa categoria, incluem-se as perdas com instalações irregulares – os famosos “gatos” e furtos de água – e as fraudes ou problemas técnicos em hidrômetros, chamados também de erros de micromedição.

homem faz manutenção em porca de cano de abastecimento de água

Com boas práticas, a concessionária Odebrecht Ambiental conseguiu reduzir o índice de perdas em um município de 60% para 20% (Foto: Thinkstock Photos)

Bons exemplos de combate às perdas

Se, em nível nacional, esmiuçar o tema das perdas na distribuição de água tratada desanima, explorar algumas experiências em nível municipal dá esperança. A Odebrecht Ambiental, por exemplo, que é responsável pelos serviços de água e esgoto em mais de 180 cidades brasileiras tem histórias inspiradoras. Em alguns casos, a concessionária conseguiu reduzir o índice de perdas em dois terços, derrubando-o de 60% para 20%. Para alcançar tamanha diminuição de perdas – tanto físicas quanto aparentes -, a empresa usa um conjunto de medidas que compõem seu “Programa de Redução de Perdas” (PRP) e que se organizam em dois grandes eixos: o combate às fraudes e o controle de vazamentos.

O trabalho começa com a reunião de informações confiáveis para que os esforços e investimentos sejam feitos com a maior eficiência possível. Em 2015, por exemplo, em um município de 125 mil moradores, a concessionária instalou 50 medidores na rede para registrar, minuciosamente e durante uma semana, o consumo e a pressão em diferentes regiões do município. Simultaneamente, 359 residências receberam sensores com função semelhante, mas calibrados para registrar o consumo doméstico.

Os dados reunidos permitiram que a concessionária identificasse, primeiro, se os volumes de consumo aferidos nas residências batiam com os volumes medidos na rede e, posteriormente, em quais partes da cidade as informações não coincidiam. Cruzando os dados com os horários e as informações cadastrais dos clientes, a empresa também conseguiu mapear onde, na cidade, ficavam as áreas com mais chances de registrar perdas e vazamentos.

O uso de tecnologia pela Odebrecht Ambiental no combate às perdas não para por aí. Uma vez deslocada a equipe até o local de verificação, entra em cena o correlacionador de ruídos, chamado geofone. “O aparelho nos ajuda a identificar o local exato do vazamento”, diz Steven Sodek, da área de engenharia da empresa. “Esse correlacionador usa pulsos de som emitidos e captados em pontos diferentes do tubo com suspeita de vazamento para indicar onde está o problema”, afirma.

Ainda no escopo do combate às perdas também se inserem os esforços para atualizar e digitalizar os cadastros dos consumidores. Com as informações mais recentes à disposição, o monitoramento automático das redes e a programação para troca de tubos e conexões, que quando falham dão origem a vazamentos e aumentam as perdas, passam a ser mais simples e rápidos.

“Um programa de redução de perdas deve combinar diversas ações para garantir que todos os focos de desperdício sejam estancados. Hoje temos diversas alternativas tecnológicas que direcionam o nosso trabalho neste sentido. É papel da concessionária dar exemplo para os clientes ao administrar a produção de água que abastece seus clientes”, diz Fernando Santos-Reis, diretor-presidente da Odebrecht Ambiental.

O cliente como aliado
cano de pvc estourado vaza água

Redes sociais e até aplicativos são alguns dos canais que os consumidores podem usar para alertar concessionárias de vazamentos (Foto: Thinkstock Photos)

Só os esforços das prestadoras de serviços de água e esgoto no combate às perdas não bastam – é preciso envolver o consumidor. Nesse sentido, a Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp) lançou, no começo de junho, um aplicativo gratuito que permite ao cliente da região metropolitana de São Paulo e região Bragantina notificar vazamentos de água e esgoto na rede.

Disponível para smartphones e tablets que rodam Android e iOS (Apple), o programa usa o sistema de posicionamento global (GPS) do aparelho para identificar o local do vazamento e exige que quem envia a denúncia faça três fotos do local. “Vamos ganhar muito em eficiência e o cidadão também vai ser beneficiado ao perceber que sua reclamação foi atendida com rapidez”, afirma Marcelo Fornaziero Medeiros, gerente do Departamento de Desenvolvimento e Gestão da Metropolitana da Sabesp.

A Odebrecht Ambiental, por sua vez, oferece canais para envio desse tipo de informação em sua página e nos perfis que a empresa mantem em redes sociais como o Facebook. “Usamos ferramentas que nos auxiliem a tomar atitudes imediatas após a identificação algum problema. Importante que como cidadãos os clientes também estejam atentos para identificar fraudes e vazamentos, tudo em favor da preservação da água”, complementa Fernando Santos-Reis, diretor-presidente da Odebrecht Ambiental.

Redução de perdas

É difícil falar em legado positivo de uma crise hídrica tão grave e onerosa quanto a de 2014 e 2015. Mas, se ficou alguma lição, ela é a de que a agenda sustentável, principalmente no que diz respeito à água, já não pode ser ignorada. E o combate às perdas deste precioso recurso merece virar prioridade nacional, como já o é em alguns municípios pelo País. Entre os especialistas no assunto, com prioridades bem colocadas, o Brasil consegue reduzir o índice de perdas para 20% até 2025. Trata-se de uma meta ousada e representaria uma redução à quase metade do índice atual. Um importante passo no caminho da eficiência desejada para um País que quer um futuro cada vez melhor para seus cidadãos, como é o caso do Brasil.