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SÃO PAULO – O inimaginável aconteceu: menos de 60 anos após sua construção, o Distrito Federal decretou pela primeira vez a necessidade de fazer racionamento de água.  A crise hídrica chegou a um de seus pontos mais críticos no fim de janeiro com o racionamento atingindo 14 regiões do DF. A medida impacta pelo menos 1,8 milhão de pessoas.

A Agência Reguladora de Águas, Energia e Saneamento Básico do Distrito Federal (Adasa-DF) e a Companhia de Saneamento Básico do DF (Caesb) adotaram a medida, autorizada desde novembro do ano passado, tendo em vista o nível do reservatório da Barragem do Descoberto, abaixo de 20%, e o baixo índice de chuvas.

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De fato choveu menos.  Historicamente, o volume de chuvas de setembro a dezembro na Bacia do Alto do Descoberto é de 669 milímetros.  Porém, no mesmo período do ano passado, esse número não ultrapassou os 520 milímetros. Outro forte agravante foi ter chovido pouquíssimo nos primeiros nove dias de janeiro, apenas 2,27% da média histórica para o mês que é de 240 milímetros. Houve ainda aumento de consumo, 16% per capita nos últimos seis anos. Somado a pouca chuva e o aumento de consumo, há ainda o baixo investimento em obras estruturantes, principalmente as voltadas para novas captações de água.

O cenário, obviamente, lembra a crise hídrica ocorrida em 2014 no Estado de São Paulo. A estiagem no Distrito Federal começou em 2016, possivelmente como reflexo do fenômeno climático El Niño e, assim como na crise paulista, um ano antes da seca, não havia crise e os reservatórios operavam com 100% de suas capacidades.

“O caso de Brasília é muito parecido com o de São Paulo, são vários fatores similares. O principal deles é o crescimento urbano. A densidade populacional aumentou muito em Brasília, especialmente nas cidades-satélites, e a capacidade para fornecer água não acompanhou na mesma proporção”, disse à revista Época, Julio Sampaio, coordenador do programa Cerrado da ONG WWF-Brasil.

Água perdida

Entre todas as semelhanças, tem-se ainda outro dado chocante. Assim como em São Paulo, que tinha uma média de 30% de perda de água, no Distrito Federal, 35% da água bombeada pela Caesb se perdem e não chegam ao consumidor final. Por ano, 86 bilhões de litros escapam no sistema de distribuição.

“Se tivéssemos essa água toda para distribuir, talvez o racionamento fosse mais suave. Com certeza, ia ajudar muito a situação atual”, afirmou ao site Metrópoles a gerente de Gestão de Perdas da Caesb, Ieda Duarte. De acordo com Duarte, em cada uma das unidades consumidoras do DF são perdidos, diariamente, 396 litros de água. A quantidade quase seria suficiente para encher uma caixa d’água de 500 litros, por exemplo, em cada residência ou prédio.

O racionamento de água no Distrito Federal está sendo feito desde 16 de janeiro por sistema de rodízio em 14 regiões administrativas abastecidas pela Barragem do Descoberto. A medida já atingiu parte de Ceilândia, Recanto das Emas, Riacho Fundo II, Vicente Pires, Colônia Agrícola Samambaia, Vila São José, Jóquei, Santa Maria, DVO, Sítio do Gama, Polo JK e Residencial Santa Maria. A previsão é que ele ocorra em um ciclo de seis dias: um dia com interrupção completa, dois de estabilização e três de fornecimento normal. No sétimo dia, o corte é retomado.

Com o racionamento, será possível que a Caesb economize “uma Ceilândia por dia”, informou ao site G1 o presidente do órgão, Maurício Luduvice. Segundo Luduvice, em seis dias de restrição, o DF deixou de gastar 550 litros de água por segundo – o suficiente para abastecer uma população de 360 mil habitantes como é o caso da região administrativa de Ceilândia.

O número supera em quase 15% a expectativa inicial da Caesb, que estimava uma economia de 400 litros por segundo. Luduvice afirma que  o resultado se dá também pela participação dos moradores que passaram a economizar.

Agora que o problema se instalou, o governo do DF e a Caesb anunciaram obras para conter a crise e  prometem investir R$ 765 milhões na ampliação dos sistemas de abastecimento. Está aí mais uma semelhança.